Rodovias do Rio Grande do Sul

Por Arthur Soffiati

Arthur Soffiati / Divulgação

Não apenas as cidades do tipo ocidental – hoje espalhadas pelo mundo – representam um corpo estranho nos ecossistemas nativos formados por campos, savanas e florestas. As rodovias também, sobretudo as asfaltadas. Elas impermeabilizam o solo, exigem a remoção da vegetação nativa, estreitam vales de rios com pontes e bueiros subdimensionados, ameaçam a fauna aquática e terrestre, representando riscos também para pessoas. Quanto mais moderna, mais impactante é uma rodovia. Daí, merecer a rede viária uma especialização da ecologia denominada ecologia de estradas.

Estrada destruída pelas chuvas recentes no Rio Grande do Sul. Rio retomando seu curso

Nas extraordinariamente volumosas chuvas que se precipitaram sobre o Rio Grande do Sul, Uruguai e norte da Argentina recentemente, várias cidades foram simplesmente varridas do mapa. Fotos aéreas delas mostram amontoados de escombros e de lixo. Fala-se muito em refazê-las, não ficando muito claro se essa reconstrução será promovida nos moldes anteriores ou se haverá um grupo de trabalho para estudar, projetar e orientar a reconstrução de modo que a cidade não seja mais tão vulnerável à próxima tempestade. Solução definitiva é algo difícil de se conceber num mundo em permanente transformação. As mudanças climáticas antrópicas estão fortemente indicando que chuvas torrenciais e contínuas, alagamentos e transbordamentos, deslizamentos, queda e elevações de temperaturas vão se tornar cada vez mais ingentes e irregulares. Soluções ideais parecem impraticáveis. Portanto, não basta apenas um representante federal que coordene processos de reconstrução. Cada vez mais se impõe a criação de grupos de trabalho multi e transdisciplinar nos planos federal e estaduais pelo menos para estudar caso a caso as consequências e o enfrentamento de desastres naturais (que não são tão naturais assim).

 Com relação a rodovias, um estudo recente mostrou onde as chuvas no Rio Grande do Sul mais afetaram a rede viária. Poder-se-ia supor que as maiores avarias ocorreram numa linha de direção norte-sul em virtude da orientação dos rios, que, em grande maioria, correm nesse sentido, formando o rio Guaíba, que desemboca na lagoa dos Patos. Porém, os estragos mais intensos foram registrados no sentido leste-oeste, entre as cidades de Gramado e Santa Maria, passando por São Leopoldo, Caxias do Sul, Porto Alegre, Lajeado e Santa Cruz do Sul.

Examine-se um mapa atualizado e verificar-se-á que a maior concentração de rodovias gaúchas se concentra nessa área. Elas formam uma espécie de barreira semiporosa para as águas fluviais, com suas pontes e bueiros. Muitas pontes ruíram, inclusive as flutuantes instaladas em regime de emergência pelo Exército. Muitos bueiros foram arrastados, abrindo brechas nas estradas e impedindo a circulação de veículos. Engana-se quem pensa que água não tem força de destruição por ser formada por moléculas unidas que giram umas sobre as outras de forma coesa.

Estradas interditadas no Rio Grande do Sul

A engenharia de estradas no Brasil ainda é muito atrasada. Reconstruir a malha viária no Rio Grande do Sul vai exigir uma nova concepção desse sistema tão consagrado em todo o mundo que é o das rodovias.