Primeiro, aproveite as condições favoráveis. A exploração de petróleo e gás na camada pré-sal começou, e o governo federal converteu em lei a medida provisória que permite a construção de portos privados. Em seguida, escolha o local economicamente mais rentável. Encomende um estudo de impacto ambiental a uma firma de consultoria, explicitando o que é desejável escrever. Se a firma considerar o projeto insustentável do ponto de vista socioambiental, eleve o preço do estudo para conseguir argumentos sofistas. Procure logo o órgão de licenciamento ambiental responsável, adiantando o que você deseja. Ele vai lhe dar um termo de referência a ser cumprido, com o quase compromisso de aprovar previamente o empreendimento. A legislação exige de você um exercício de abstração, inventando duas outras áreas aonde o porto poderia ser construído e explicando o que aconteceria com a área previamente escolhida se o porto não fosse erguido nela. A firma de consultoria cuidará disso.
A receita acima foi seguida pela empresa Queiroz Galvão e pela Masterplan – Consultoria de Projetos e Execução Ltda. O local escolhido para o porto foi Macaé por situar-se no ponto mais próximo do terminal da Petrobras, já pequeno para suas operações. Com o novo porto, os navios fundados à espera de vaga para aportar contarão agora com mais dez ou onze berços. A fim de demonstrar que a única opção viável para um novo porto na Região Sudeste é Macaé, a firma de consultoria examinou duas alternativas em Angra dos Reis e uma em Maricá para logo descartá-las, alegando que a legislação federal e municipal, bem como as normas da Agência Nacional de Transportes Aquaviários, não as permitem. Conheço bem este expediente. Supõe-se a localização de um empreendimento na Lua ou em Marte para demonstrar obviamente que ele só cabe na Terra.
Mas em que ponto da costa de Macaé assentar o porto, se toda ela está urbanizada, restando apenas a Praia do Pecado e um remanescente de restinga na extremidade oeste da Restinga de Jurubatiba? Não convém mexer na Praia do Pecado porque existe um movimento antigo pleiteando sua proteção por uma unidade de conservação. Restou, assim, o último fragmento de restinga, na margem esquerda do Rio Macaé.
A área escolhida é diferente da Praia de Imbetiba, onde foi erguido o porto da Petrobrás por não contar com nenhuma formação pedregosa que permita amarrar uma estrutura portuária. O remanescente de restinga escolhido servirá apenas para as instalações continentais. Ele foi dividido em três seções: duas entre a rodovia RJ-106 e a praia e a terceira entre esta rodovia e o Canal Macaé-Campos. O atracadouro do porto vai ser construído no mar com areia obtida na abertura de um canal submarino. Trata-se de um aterro no mar ligado ao continente por uma ponte. Para proteger o complexo, será construído um quebra-mar com pedras. A receita é muito semelhante à dos outros portos previstos para a costa entre os Rios Macaé e Itapemirim porque a realidade ambiental é muito parecida em todos. Esta macrodimensão não foi contemplada pelos estudos.
A proximidade do porto em relação a unidades de conservação, nos outros locais aventados, tornou-se forte impedimento legal para ele. Atualmente, um empreendimento do porte do Tepor (nome da empresa criada para construir e operar o porto) deve ficar distante 3 km de extensão de uma unidade de conservação. Em torno do Tepor, existem quatro. O Parque Nacional da Restinga de Jurubatiba dista cerca de 2,5 km dele, enquanto que, do Parque Natural Municipal do Estuário do Rio Macaé, fica em torno 2,7 km. Já o Parque Natural Municipal do Arquipélago de Santana está em conflito com o Tepor. Do ponto de vista social, o empreendimento gerará 500 empregos diretos e 100 indiretos na fase de instalação. Na fase de operação, os diretos vão girar em 400 e os indiretos, em exatos 148, sendo o Efeito-renda calculado em 616.
O estudo reconhece os problemas sociais de Macaé, mas não os atribui à Petrobras, sua cliente preferencial. O Tepor se apresenta como solução para o desequilíbrio socioambiental, omitindo que ele também gerará problemas. E, finalmente, o que acontecerá com a área escolhida para o porto se ele não for aprovado? Segundo o estudo, sofrerá toda ela uma espécie de favelização, o que soa intimidatório. Em suma, o porto destruirá a área para que ela não seja destruída por uma favela. Trata-se de uma falsa questão, pois a área pode muito bem protegida pela prefeitura, exigindo-se da Petrobras que pague sua dívida socioambiental com Macaé e que procure os muitos portos na Região Sudeste.