Por Marcos Pedlowski
Em março deste ano, escrevi uma espécie de artigo premonitório sobre o fracasso que seria realização da Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2025 (a chamada COP30) na cidade de Belém entre os dias 10 e 21 de novembro de 2025. Naquele texto alinhavei uma série de fatores que me permitiam traçar um cenário pouquíssimo otimista para este que é uma espécie de megaevento climático.
O problema é que passados sete meses, as minhas conjecturas estão sendo ultrapassadas pela realidade objetiva dos fatos. Um exemplo foi a concessão da licença ambiental para exploração de petróleo e gás na Foz do Rio Amazonas. Vários comentaristas mais informados do que eu sobre as entranhas deste processo, já mostraram que um dos erros capitais ocorridos nas análises feitas pelos técnicos do Ibama foi utilizar dados fornecidos pela própria Petrobras para as estimativas de impactos relacionados às intercorrências que são muito comuns nas atividades petrolíferas. Usar os dados da Petrobras equivale a dar a chave do galinheiro para a raposa tomar conta das galinhas. Mas a ministra Marina Silva preferiu se manifestar dizendo que a decisão da equipe técnica do Ibama havia sido “técnica”, o que nem uma criança recém-entrada no jardim de infância acredita.
Mas os problemas da licença concedida não acabaram, apenas começaram. É que a direção da Petrobras agora postula a inclusão de mais três poços exploratórios na licença ambiental para perfuração na bacia da Foz do Amazonas. A solicitação teria sido feita em 24 de outubro de 2025, e ocorreu após a empresa obter a aprovação para iniciar a perfuração do primeiro poço na região. Aqui já seria o caso do “passa um boi, passa uma boiada”, e se concretizado representará um avanço acelerado para o início das atividades de extração, ignorando todos os riscos que isto representa.
Uma coisa que nunca é mencionada publicamente, seja pela Petrobras ou por qualquer ministro do governo Lula, se refere ao montante de emissões de CO2 possíveis, caso as melhores expectativas das reservas na Foz do Amazonas sejam confirmadas e que todo este montante seja efetivamente explorado. Se usarmos a estimativa de ~30 bilhões de barris associada à Margem Equatorial e o fator padrão de combustão de ~0,4319 tCO₂ por barril, a queima desse petróleo corresponderia a ≈ 13,0 gigatoneladas de CO₂ (≈12,96 GtCO). Há que se lembrar que ~13 GtCO₂ é um valor enorme: já que representa aproximadamente um terço das emissões anuais globais atuais (ordem de grandeza ~37–38 GtCO₂/ano em 2024).
O presidente Lula em sua face para exportação, aquela em que ele se mostra um paladino da adaptação para as mudanças climáticas em curso, desconversa e continua tentando vender uma variante diversionista que é a conservação das florestas brasileiras como receita para o combate à aceleração do aquecimento da Terra. Eu digo que mesmo o suposto compromisso com a conservação das florestas é diversionista por um motivo simples. O compromisso objetivo do governo Lula é com um modelo que eu chamo de economia agromineral. Por um lado, se incentiva a exploração de petróleo e gás, enquanto se financia de maneira nada frugal a produção de commodities agrícolas, inclusive às custas do que ainda resta de florestas na Amazônia e no bioma do Cerrado. Basta ver os valores alocados para o Plano Safra de 2025/2026 que entregou R$ 516,2 bilhões para a agricultura empresarial , enquanto reservou apenas 78,2 bilhões são para a agricultura familiar. Em outras palavras, enquanto muitos se chocaram com o mote de campanha do presidente Donald Trump, o “Drill, Baby Drill” (Perfura, bebê Perfura!), pouco se fala que para Lula o mote correto “Perfura e desmata, bebê Perfura e desmata!
Por outro lado, vários estudos científicos já estão mostrando que, por causa do aquecimento acelerado da atmosfera, as florestas tropicais estão passando da condição de sumidouros para emissoras de carbono. Com isso, a soma total das emissões anuais de CO2 tenderia a aumentar ainda mais rapidamente. Para piorar, há uma crescente concordância na comunidade científica de que as florestas estão se tornando mais combustíveis e que grandes incêndios florestais vão continuar ocorrendo e em número e intensidade cada vez maiores.
Diante deste contexto fático, voltemos então às chances da COP30 não ser um fracasso completo. Eu diria que as chances são agora negativas. Um elemento que garante isso é que cerca de um mês do início do evento, apenas 87 delegações já confirmaram ter hospedagens garantidas em Belém. Além disso, há que se lembrar que até o momento apenas 162 países confirmaram presença na COP30, um número abaixo do que ocorreu na COP21 realizada em Paris quando 190 países estiveram presentes. Assim, o que temos diante de nós é um abandono tácito desta arena de debates em prol de um compromisso explicito com a aceleração do modelo de economia fóssil que está na raiz dos problemas que as COPs nunca sequer arranharam.
Recentemente fui perguntado por uma ativista ambiental se valeria a pena ir para Belém para participar dos eventos paralelos que ocorrerão durante a COP30. Eu respondi que dados os custos elevados de transporte e hospedagem e a futilidade que é dar uma roupagem cívica à COP30, o melhor seria apostar em eventos locais que ocorrerão em diversos estados brasileiros que formam uma espécie de anti-COPs. Um exemplo é o “Encontro Anticapitalista pelo Clima e pelo fim dos Genocídios” que deverá ocorrer na cidade do Rio de Janeiro entre 20 e 23 de novembro sob os auspícios de ativistas ambientais, cientistas e organizações de esquerda. Considero que este tipo de evento deverá gerar mecanismos de organização muito mais sólidos e efetivos do que qualquer coisa que seja decidido em Belém. É que seguir apostando nas soluções propostas por quem está na raiz do problema já se mostrou um completo e rotundo fracasso.
A saída para o colapso climático que se avizinha terá de ser inevitavelmente pela esquerda. Afinal de contas, como disse e escreveu a física e filósofa alemã e membro do IPCC, Friederike Otto, a crise climática envolve questões de gênero, raça e classe. Assim, quanto antes a luta climática se der nesses termos, maiores serão as nossas chances de enfrentar o futuro que se avizinha.










