Finalmente, uma ala importante dos negacionistas e dos deixapralaístas começa a reconhecer que o clima está mudando por ações humanas praticadas no âmbito de uma economia de mercado hoje global. Mas não basta o reconhecimento. É preciso mais ação. Entramos em guerra contra a natureza, que agora ganhou força e está nos bombardeando com chuvas descomunais, secas intensas, ondas de calor e de frio, tempestades de neve e incêndios. A região norte/noroeste fluminense sofre esse bombardeio, mas também atuou na guerra contra o clima. Como?
Florestas. A partir de Guarus e subindo a serra pela margem esquerda do rio Paraíba do Sul, todo o território era coberto por densas florestas. Na margem direita do rio, essas florestas se estendiam de Quissamã à Serra do Mar (Imbé). Um processo secular de destruição acabou com elas. Restaram manchas na margem esquerda e uma área maior na margem direita teoricamente protegida pelo Parque Estadual do Desengano. As vastas florestas foram derrubadas em nome do progresso para dar lugar a lavouras e pastos, para alimentar os fornos das usinas e locomotivas, para a construção de cidades. A região deu a sua contribuição para as mudanças climáticas lançando gases na atmosfera.
Rios e lagoas. Sem florestas, o solo ficou exposto. As chuvas continuaram caindo e os ventos continuaram soprando. A erosão aumentou. Solos foram varridos para os leitos dos rios, que correm em terreno mais baixo que as margens, e provocaram turbidez da água, assoreamento dos leitos, bloqueio dos raios solares e danos à flora e à fauna aquáticas. Nem mesmo as matas em pontos críticos, como topos de morros, nascentes e margens de rios foram poupados. Quanto às lagoas das planícies, em grande parte, elas sofreram drenagem para ampliar os terrenos disponíveis para a cana e o gado. Também a conversão de áreas úmidas em áreas secas liberou gases para a atmosfera.
Cidades. Campos e São João da Barra iniciaram o processo de urbanização da região no século XVII. A malha urbana de ambas era reduzida no início. Campos ergueu-se entre lagoas que foram transformadas em receptáculos de esgoto e lixo. Depois de as poluírem, os moradores pressionaram o poder público para aterrá-las, mas elas foram pavimentadas com pedras e depois com asfalto. Hoje, quando chove um pouco mais, elas ressurgem em vários pontos da cidade por conta do solo impermeabilizado.
O interior foi sendo progressivamente colonizado seguindo o curso dos rios Paraíba do Sul, Muriaé e Itabapoana. De Minas Gerais, também partiam levas de colonos em direção ao sul. O rio Pomba foi o eixo para a abertura da famosa estrada Minas-Campos. À medida que colonos penetravam no que seria a Região Noroeste Fluminense, o desmatamento aumentou. Estradas e ferrovias foram se estendendo. A erosão foi se acentuando. Lavouras e pastos ocuparam o lugar das matas.
E cidades foram erguidas. De preferência, nas margens de rios. Alguns núcleos urbanos do Noroeste Fluminense cresceram, como Santo Antônio de Pádua, às margens do Pomba; Itaperuna, as margens do Muriaé; e Bom Jesus do Itabapoana, às margens do Itabapoana. Tanto estas quanto as menores sofrem com as mudanças climáticas. No verão, ou mesmo fora dele, chuvas intensas provocam transbordamentos, alagamentos e deslizamentos. No inverno ou fora dele, estiagens prolongadas atingem a economia rural com secas e incêndios.
E, nessa nova realidade causada pelas mudanças climáticas, as autoridades públicas, continuam governando à moda antiga: atacando problemas pontuais sem planejamento de longo prazo para adaptar a região aos novos tempos. O clima está doente e precisa de médicos.
Além de nada fazerem mudanças significativas nas cidades, os poderes públicos municipais continuam com uma visão antiga de desenvolvimento. Fala-se na retomada de um grande empreendimento em Barra do Furado no valor de bilhões de reais. Traduzir em dólar impressiona mais. Fala-se numa zona de negócios entre o Farol de São Tomé e o Açu, como se não existisse um Parque Estadual no meio do caminho protegendo a lagoa do Açu. Em Macaé, um novo porto já está licenciado. Como não há mais espaço no continente, ele está previsto para o mar, afetando o arquipélago de Santana. Especula-se ainda sobre a instalação de termoelétricas e de uma pequena central hidrelétrica no rio Macaé. A capacidade deste rio em fornecer água ultrapassou seu limite. A economia de mercado não tem a percepção de limites como se entendesse ainda a natureza como ilimitada em fornecer recursos e absorver rejeitos.
Sabe-se que empresários planejam na surdina introduzir a monocultura do eucalipto em larga escala para fornecer gravetos para a Europa queimar. Da mesma forma, propostas que pareciam superadas, como a remoção do durinho da valeta na lagoa Feia, voltam à tona. Todo e qualquer discurso em prol do desenvolvimento sustentável é apenas propaganda. Só contamos com a inviabilidade desses projetos em termos econômicos para que não vinguem.