Brasil não tem dados transparentes sobre desmatamento autorizado em imóveis rurais. Conselho também aprovou moções importantes em reunião em Brasília.
O Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) aprovou, na quarta-feira (4), uma resolução que traz regras gerais e estabelece critérios de transparência para supressão autorizada de vegetação nativa em propriedades rurais no Brasil. Atualmente, país não tem dados transparentes sobre desmatamento legal em propriedades privadas.
A resolução dispõe sobre critérios técnicos, condições de validade, transparência, integração e publicidade de informações sobre a emissão de Autorizações para Supressão de Vegetação Nativa, conhecida pela sigla ASV.
A ASV é um ato administrativo emitido pelo órgão ambiental, majoritariamente o estadual, que estabelece critérios e condicionantes técnicos e metodológicos obrigatórios para a realização do desmate legal de vegetação nativa e formações sucessoras em propriedades privadas.
Até o momento, no entanto, cada estado possuía sua própria norma, o que dificultava não só a unificação de entendimento sobre critérios para conceder a ASV, como também tornava a transparência um desafio.
“Até então, a gente não tinha uma norma nacional, só as normas dos estados e algo do IBAMA. Isso gerava muita divergência de aplicação da legislação e falta de transparência”, explica Ana Carolina Crisostomo, Líder de Incidência Política do WWF-Brasil e membra do Conama.
Em entrevista a ((o))eco, Crisostomo explicou que a resolução determina, por exemplo, que o proprietário do imóvel rural deve estar com o Cadastro Ambiental Rural ativo, ter a identificação geoespacial de sua Reserva Legal (RL) e Áreas de Preservação Permanente (APP) e estar com o número do Sistema Nacional de Cadastros Rurais identificado para solicitar a ASV, entre outros critérios técnicos.
Todos os estados também serão obrigados a manter a transparência no Sistema Nacional de Controle da Origem dos Produtos Florestais (Sinaflor) sobre as ASVs concedidas.
“São avanços que parecem muito óbvios, mas que hoje a gente não consegue fazer. O próprio governo federal afirma que, atualmente, não sabemos dizer, com precisão, o que temos de desmatamento autorizado no país”, complementa.

O aprimoramento das normas para emissão de ASVs não é uma demanda nova. Em meados de 2024, a Associação Brasileira dos Membros do Ministério Público de Meio Ambiente (ABRAMPA) já havia publicado uma nota técnica com recomendações para a adequação dos processos de concessão do documento.
Na nota, a Associação ressaltava que o Brasil tem registrado altas taxas de desmatamento relacionadas ao descontrole das ASVs. Segundo a entidade, muitas autorizações têm sido concedidas fora da lei. De acordo com dados do próprio Governo Federal, em 2023, por exemplo, metade do desmatamento no Cerrado ocorreu de modo autorizado, mas com indícios de ilegalidades.
“Há muitas falhas nos processos das Autorizações de Supressão de Vegetação que precisam ser corrigidas enquanto é tempo. O que observamos é um cenário de absoluto descontrole na concessão dessas autorizações, especialmente no Cerrado. Incluindo descumprimentos reiterados da própria Lei Nacional de Vegetação Nativa, concessões de autorizações por municípios não devidamente habilitados ao licenciamento ambiental, e falta de transparência, o que têm causado afronta aos direitos constitucionais ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, à estabilidade climática e ao acesso à informação”, destacou o presidente da ABRAMPA e promotor de justiça do MPPR, Alexandre Gaio, por ocasião da divulgação da nota técnica.
A resolução vai passar agora por consulta jurídica e depois será enviada para assinatura da ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva. O processo deve demorar em torno de 20 dias. Após esse trâmite, os estados terão cerca de 180 dias para se adaptarem às novas regras unificadas.
Outras decisões do Conama
Na reunião de quarta-feira, o Conama aprovou importantes documentos, como a Moção pelo Fim da Exportação de Barbatanas de Tubarões pelo Brasil, a Moção Pelo Fim da Exportação de Animais Vivos para Abate e a recomendação relativa à incorporação, pelos órgãos do Sistema Nacional do Meio Ambiente (Sisnama), das diretrizes do Plano Clima.
Um dos documentos, no entanto, gerou controvérsia. O colegiado apresentou uma Moção de manifesto e urgência para que sejam mantidos os 63 vetos da Presidência da República à Lei Geral do Licenciamento.
Segundo Ana Carolina Crisostomo, da WWF-Brasil, o posicionamento do Conama sobre o tema é relevante por se tratar do maior órgão consultivo e deliberativo sobre meio ambiente no país.
Chamou atenção na reunião do Conselho que nem todos os conselheiros aprovaram a Moção, vários deles membros o atual governo, inclusive. O fato foi mencionado pelo próprio secretário-executivo do MMA, João Paulo Capobianco.
“Queria, como presidente deste conselho e membro do governo federal, manisfestar estranheza que representantes do governo federal tenham votado contrários à moção de defesa dos vetos do presidente. Que fique consignado em ata”, disse Capobianco.
A 147ª reunião do Conama também seguiu ao longo desta quinta-feira (4). As decisões podem ser conferidas aqui.