SUSTENTABILIDADE PARA QUEM? Um olhar sobre a pesca artesanal em Macaé

Programa de Pós-Graduação em Ciências Ambientais e Conservação – PPG-CiAC – NUPEM/UFRJ.

 

Autores:

Prof. Dr. Alexandre de Azevedo

Prof. Dr. Sergio Bolassina

Allan Pierre Bonetti Pozzobon

Diego Gazone Rodrigues Silva

Eduarda Rezende Caillava Gomes

Gabrielle Souza de Araújo

Jessica Mulinari Mota

Meriane Dos Santos Paula

 

A pesca é uma das atividades mais antigas da história da humanidade, e segue crescendo como importante fonte de alimentação e renda para milhões de pessoas em todo o mundo. Em 2014, a pesca de captura atingiu 93,4 milhões de toneladas, sendo a maior parte de origem marinha.

Atualmente, a atividade é dividida em duas modalidades comerciais: industrial e artesanal, ambas regulamentadas pela Lei nº 11.959, de 29 de Junho de 2009. A pesca industrial possui profissionais com vínculo empregatício ou em regime de cotas por parceria, e utiliza embarcações de médio a grande porte. Já a pesca artesanal é praticada diretamente por pescadores/as profissionais, de forma autônoma ou com parceria, portando meios de produção próprios e embarcações de pequeno porte. Mais da metade do pescado capturado no mundo é obtido através da pesca artesanal, e essa prática é responsável por empregar 90% dos 35 milhões de pescadores/as do planeta.

No Brasil, segundo dados do extinto Ministério da Pesca e Aquicultura, em 2011 a pesca extrativista marinha se destacava como a principal fonte de produção de pescado, seguida pela aquicultura continental, pela pesca extrativista continental e pela aquicultura marinha.

O Rio de Janeiro é um dos maiores mercados consumidores dentre os estados brasileiros. Sua diversidade geográfica costeira e suas características oceanográficas favoráveis – como os fenômenos de ressurgência que enriquecem de nutrientes as águas marinhas – garantem uma boa produtividade pesqueira.

Ao norte do estado, encontra-se o município de Macaé, onde as atividades de pesca artesanais são realizadas principalmente por frotas de emalhe, cerco, linha, espinhel e arrasto, e a produção anual de pescados é de mais de 530 toneladas. No ano de 2014, os principais recursos pesqueiros extraídos na região marinha foram: peixe galo, dourado, corvina e cavala. Já em 2015, os pescados dominantes foram: goete, dourado, corvina, galo e enchova. A pesca de arrasto do camarão também possui representatividade econômica na região, somando um total de 47.783 kg em 2014 e 2015. É provável que esses dados estejam subestimados, pois não contemplam todos os pontos de desembarque do pescado.

 

Principais pescados em Macaé nos anos de 2014 e 2015. Tabela elaborada a partir de dados da Fundação Instituto de Pesca do Estado do Rio de Janeiro (FIPERJ).

 

2014 2015
Pescado desembarcado Peso (kg) Pescado desembarcado Peso (kg)
Galo 107.080 Goete 74.653
Dourado 101.132 Dourado 67.600
Goete 42.223 Corvina 31.420
Corvina 38.580 Galo 25.798
Cavala 22.185 Enchova 16.905

 

O Mercado de Peixes, inaugurado em 1924 e reinaugurado após ampla reforma em 2015, concentra grande parte das atividades da cadeia produtiva do pescado, incluindo desembarque, beneficiamento e venda. Macaé possui 1,5 mil pescadores/as cadastrados, contando com uma frota de 400 barcos e 15 mil trabalhadores ligados direta e indiretamente às atividades pesqueiras, cerca de 15% da população economicamente ativa na região.

Em concomitância com o cenário exposto, pescadores/as artesanais estão inseridos/as em diversos conflitos socioambientais gerados pelo confronto entre formas de uso incompatíveis de um determinado território.

No caso de Macaé, parte do conflito está relacionada à disputa do território marinho, e tem como principal característica a invisibilização do pescador artesanal face às pressões da indústria petrolífera. Nesta disputa desigual de forças prevalece o grande capital. Contudo, existem movimentos organizados pelos pescadores artesanais que seguem resistindo às pressões[1].

Em outro ponto do conflito estão pesquisadores e pesquisadoras envolvidos/as na atividade pesqueira por meio de diferentes áreas do conhecimento que buscam: entender como funcionam os estoques pesqueiros e a capacidade de resposta dos ecossistemas diante de impactos; produzir junto aos pescadores técnicas de coleta/pesca que geram um impacto negativo menor (como a definição de períodos de defeso de determinadas espécies ou emprego de redes de malhas que não capturem organismos jovens); e desenvolver pesquisas nas áreas das Ciências Sociais e Humanas. O quadro abaixo apresenta alguns trabalhos acadêmicos que envolvem a pesca na região com destaque para a cidade de Macaé.

 

Trabalhos acadêmicos publicados que envolvem a pesca em Macaé e outros municípios da Região Norte Fluminense.

 

Título Autores Ano Instituição Revista
A Pesca Artesanal na costa norte do Rio de Janeiro DI BENEDITTO 2001 UENF Bioikos 15 (2)
Pesquisa Ação na Cadeia Produtiva da Pesca em Macaé PAPESCA/ Macaé MACIEL et al. 2006 SOLTEC /UFRJ Relatório final FINEP
Monitoramento do rio Macaé com base na participação das escolas públicas, uma ação para a sustentabilidade COSTA & FARIAS 2008 NUPEM /UFRJ Visões 4(1)
A experiência da Papesca/UFRJ em Macaé-RJ, Brasil LIANZA et al. 2009 UFRJ Trabalho em congresso
A Pesca Artesanal em Macaé-RJ SILVA et al. 2012 NUPEM /UFRJ Trabalho em congresso
Conflitos ambientais e territoriais: Pesca e petróleo no litoral fluminense HERCULANO 2012 UFF Nature and Conservation 5(1)
Gestão dos recursos pesqueiros no Brasil e panorama da pesca artesanal em Macaé, RJ SILVA et al. 2012 UFRJ / IFF Bol. Obs. Alberto Lamego
Caracterização das relações socioeconômicas da cadeia produtiva da pesca em Macaé-RJ: Transformação e impactos associados à economia do petróleo SILVA 2013 IFF Dissertação
O LUGAR COMO AQUARELA DE NATUREZA E CULTURA:a topoafetividade dos pescadores da Boca da Barra, em Rio das Ostras, RJ SANTA ANA et al. 2014 NUPEM /UFRJ Dissertação

[1] Para saber mais: www.peloterritoriopesqueiro.blogspot.com.br

 

Quando a Universidade vai à escola: A experiência em Educação Ambiental do colégio municipal de pescadores de Macaé/RJ 2007-2010 COSTA et al. 2014 NUPEM /UFRJ REMEA 31 (2)
A Pesca Artesanal em Macaé-RJ: Uma abordagem Etnoictiológica como subsídio para o manejo de cianídeos BAU et al. 2015 NUPEM /UFRJ Dissertação
Pescadores artesanais de Macaé: Perfil socioeconômico e subsídios para a certificação da pesca CALLEJA et al. 2015 NUPEM /UFRJ Dissertação
Carcinofauna acompanhante da pesca do Camarão-Sete-Barbas Xiphopenaeus kroyeri em Macaé, Rio de Janeiro, sudeste brasileiro DA COSTA et al. 2016 UNESP/Bauru Bol. Inst. Pesca, São Paulo 42 (3)

 

As pesquisas sobre a pesca que a entendem apenas como atividade nociva ao meio ambiente podem vir a subsidiar ações e políticas que irão agravar o processo de invisibilização dos pescadores artesanais e limitar ainda mais o acesso aos pesqueiros. Porém, as pesquisas que compreendem a atividade pesqueira em sua complexidade, pensando nas relações socioculturais, econômicas e ambientais, podem vir a colaborar com a luta diária desse importante grupo social.

Os atores, os conflitos e as problemáticas sobre esse tema devem sempre ser levados em consideração, principalmente por aqueles que vão decidir e aplicar as normativas da atividade, para que a mesma possa ser sustentável, não apenas para o ambiente, mas também para as pessoas que dela dependem e que nessa prática encontram sua identidade.

FONTES

 ACESLRAD, H. Apresentação In_ A insustentável leveza da política ambiental – desenvolvimento e conflitos socioambientais. Zhouri, A.; Laschefski, K.; Pereira, D. B. (Org.) Belo Horizonte: Autêntica, 2005.

BAU, E. P. L. A Pesca Artesanal em Macaé-RJ: Uma abordagem Etnoictiológica como subsídio para o manejo de cianídeos. Dissertação (Mestrado em Ciências Ambientais e Conservação). Universidade Federal do Rio de Janeiro, Campus Macaé. 2015. Disponível em: <http://www.macae.ufrj.br/ppgciac/images/Disserta%C3%A7%C3%B5es/Elaine_Paes_de_Lima_Bau.pdf>

BRASIL. Lei Nº 11.959, de 29 de junho de 2009. Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável da Aquicultura e da Pesca. 2009.

CALLEJA, D. L. Pescadores artesanais de Macaé: Perfil socioeconômico e subsídios para a certificação da pesca. Dissertação (Mestrado em Ciências Ambientais e Conservação). Universidade Federal do Rio de Janeiro, Campus Macaé. 2015. Disponível em: <http://www.macae.ufrj.br/ppgciac/images/Disserta%C3%A7%C3%B5es/DESIDERIA_LIMA_CALLEJA.pdf>.

COSTA, R. N.; FARIAS, M. F. Monitoramento do rio Macaé com base na participação das escolas públicas, uma ação para a sustentabilidade. Visões, Macaé, v. 1, n. 4, p. 1-16, 2008.

COSTA, R. N.; OLIVEIRA, V. A. N.; LIANZA, S.; PERREIRA, C. S. Quando a Universidade vai à escola: a experiência em educação ambiental do Colégio Municipal de Pescadores de Macaé/RJ, 2007-2010. REMEA – Revista Eletrônica do Mestrado em Educação Ambiental, [S.l.], v. 31, n. 2, p. 261-279, dez. 2014. Disponível em: <https://www.seer.furg.br/remea/article/view/4719/3093>.

DI BENEDITTO, A. P. M. A Pesca Artesanal na Costa Norte do Rio de Janeiro. Bioikos, PUC-Campinas 15 (2): 103-107. 2001.

DA COSTA, R. C.; CARVALHO-BATISTA, A.; HERRERA, D. R.; PANTALEÃO J. A. F.; TEODORO, S. S. A.; DAVANSO, T. M. Carcinofauna Acompanhante da Pesca do Camarão-Sete-Barbas Xiphopenaeus kroyeri em Macaé, Rio de Janeiro, Sudeste Brasileiro. Bol. Inst. Pesca, São Paulo 42 (3): 611-624. 2016.

FAO. El estado mundial de La pesca y La acuicultura 2016. Contribución a La alimentaria y La nutrición para todos. Roma. 224 pp. 2016.

FAO. The state of world fisheries and aquaculture. Rome: Food and Agricultural Organization of the United Nations. 2010. Disponível em: <http://www.fao.org/docrep/013/i1820e/i1820e.pdf>

FIPERJ. Diagnóstico da Pesca do Estado do Rio de Janeiro. Fundação Instituto de Pesca do Estado do Rio de Janeiro. Niterói, 2013.

FIPERJ. Relatório anual sobre pesca extrativista marinha no Estado do Rio de Janeiro. Fundação Estadual de Pesca do Estado do Rio de Janeiro. Niterói, 2014. Disponível em: <http://www.fiperj.rj.gov.br/fiperj_imagens/arquivos/revistarelatorios2014.pdf>.

FIPERJ. Relatório anual sobre pesca extrativista marinha no Estado do Rio de Janeiro. Fundação Estadual de Pesca do Estado do Rio de Janeiro. Niterói, 2015. Disponível em: www.fiperj.rj.gov.br/fiperj_imagens/arquivos/revistarelatorios2015.pdf

GEO Brasil. Perspectivas do Meio Ambiente no Brasil. Brasília: IBAMA, 447 p., 2002.

HERCULANO, S. Conflitos ambientais e territoriais: Pesca e petróleo no litoral fluminense. Nature and Conservation 5 (1), 2012.

LIANZA, S.; MACIEL, V. F.; JOVENTINO, F. K. P.; ALENCAR, C. A. A.; ADDOR, F. A experiência da Papesca/UFRJ em Macaé-RJ, Brasil. Trabalho apresentado em congresso. 2009. Disponível em: <http://cdsa.aacademica.org/000-062/1116.pdf>.

MACIEL, V.; ADDOR, F.; LIANZA, S. 2006. Pesquisa Ação na Cadeia Produtiva da Pesca em Macaé PAPESCA/ Macaé. SOLTEC/UFRJ- FINEP Disponível em: <http://www.soltec.poli.ufrj.br/RelatorioFINEP-VFinal.pdf>.

Ministério da Pesca e Aquicultura. Boletim Estatístico da Pesca e Aquicultura – Brasil, 2011.

PREFEITURA MUNICIPAL DE MACAÉ. Mercado Municipal de Peixes: um ponto tradicional em Macaé. Macaé, RJ: Secretaria de Desenvolvimento Econômico e Tecnológico e Turismo. 2016. Disponível em: <http://femass.edu.br/noticias/leitura/noticia/macae-e-referencia-na-producao-de-pescado>.

SANTA ANA, C. A. R.; CAMARGO, G. A.; LEAL, G. F. O lugar como aquarela de natureza e cultura: a topoafetividade dos pescadores da Boca da Barra, em Rio das Ostras, RJ. Dissertação de mestrado do Programa de Pós-Graduação em Ciências Ambientais e Conservação, UFRJ/Macaé, 2014.

SILVA, N. R.; MENDONÇA, D. F.; AZEVEDO, A.; FERREIRA, M. I. P. A Pesca Artesanal em Macaé-RJ. In: IV ENCONTRO NACIONAL DOS NÚCLEOS DE PESQUISA APLICADA EM PESCA E AQUICULTURA, 2012, Foz do Iguaçu. Anais. Foz do Iguaçu: Essentia, 2012. Disponível em: <https://www.google.com.br/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=15&cad=rja&uact=8&ved=0ahUKEwjV3rjO8f7QAhVBCpAKHXgLBMU4ChAWCDIwBA&url=http%3A%2F%2Fwww.essentiaeditora.iff.edu.br%2Findex.php%2FENNUPAS%2Farticle%2Fdownload%2F2587%2F1430&usg=AFQjCNED1wFJMCqwKUbSg10x6lKYoGLsFA&bvm=bv.142059868,d.Y2I>.

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