Bastaria pouco, muito pouco. Para neutralizar o processo degenerativo que está causando o aquecimento global, nos termos previstos pelo Acordo de Paris de 2015, bastaria um forte entendimento entre poucos países que servem de líderes, pondo em campo políticas equilibradas em todo o setor industrial e energético. É a tese do Climate Action Tracker, um grupo de pesquisa internacional que, na última sexta-feira, às vésperas do Dia Mundial da Terra promovido pela ONU, publicou um relatório sobre as estratégias mais eficazes para reduzir os gases de efeito estufa e proteger o planeta.
O documento mostra um dado muito significativo: para implementar velozmente e de maneira duradoura a descarbonização da indústria e mudar de rumo em direção às energias renováveis não são necessários grandes acordos globais e negociações infinitas, mas o compromisso e a lideranças de poucos países líderes que podem abrir o caminho e servir de modelo para os outros.
O relatório cita o exemplo de alguns setores em que essa estratégia já se mostrou bem-sucedida. No setor elétrico, responsável por 40% dos gases de efeito estufa relacionados com a energia, a virada verde foi iniciada graças aos investimentos em energias renováveis e às políticas realizadas por poucos países como a Dinamarca, Alemanha, Espanha e China no campo da energia eólica e fotovoltaica. Nesses países, entre 2006 e 2015, a capacidade de produção de energia eólica aumentou 600% e de fotovoltaica em até 3.500%.
Outro exemplo é o dos transportes, causa de um quinto da produção de gases de efeito de estufa. Nesse setor, a revolução passa pelos carros elétricos. Na vanguarda, estão a Holanda, a Noruega, a Califórnia e a China. A partir desses modelos – ressaltam os especialistas – é preciso recomeçar.
Recomeçar não só com o relançamento dos acordos globais assinados em Paris, mas também com a expansão da revolução em curso em setores que ainda não a conhecem. Como exemplo – enfatiza ainda a relação do Climate Action Tracker –, uma verdadeira virada verde não existiu no campo da indústria imobiliária. Só com climatização, cozinha e iluminação, os edifícios produzem cerca de 20% dos gases de efeito estufa. O potencial tecnológico para mudar de rota existe, mas não existe o compromisso dos governos.
O relatório do Climate Action Tracker é apenas um dos muitos documentos publicados por ocasião do Dia Mundial da Terra, a maior manifestação ambientalista do mundo, que se celebra no dia 22 de abril.
O evento, este ano, ocorre em um momento particularmente tenso em nível político. O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, nunca guardou qualquer segredo sobre a sua vontade de se retirar do entendimento de Paris, cancelando os procedimentos do seu antecessor, Obama. Na realidade, o jogo na Casa Branca é muito complexo, e o fronte dos republicanos também não é tão compacto. Basta pensar no fato de que, há poucos dias, foi cancelada a reunião dos principais conselheiros de Trump que deveria formular as recomendações a serem entregues ao presidente a respeito da política climática. O tema, em todo o caso, estará sobre a mesa do G7 de Taormina, nos dias 26 e 27 de maio.
Mas não há apenas a política. O Dia da Terra também é um evento global, que visa a envolver o maior número de pessoas em todo o mundo por meio de manifestações e iniciativas. O objetivo é sensibilizar sobre questões como a reciclagem, a poupança energética, a proteção e o respeito das áreas verdes. Nos 193 países das Nações Unidas, pelo menos um bilhão de pessoas em 22.000 organizações participarão do dia.
Nesse contexto, será realizada nas principais metrópoles de 40 países, a marcha da ciência, um evento promovido pelo comitê estadunidense do Earth Day Network, de acordo com o qual “trata-se do primeiro passo de um movimento global pela defesa do papel vital da ciência para a saúde, a economia, a segurança e os governos”.
Entre as adesões à manifestação, figuram ilustres instituições científicas como a American Association for the Advancement of Science, a American Chemical Society e a American Geophysical Association. Sem contar muitos especialistas das agências governamentais, como a Enviromental Protection Agency e a Food and Drug Administration.
O coração da manifestação será Washington, com uma marcha ao longo da avenida perto da Casa Branca, palco das principais manifestações pela luta pelos direitos civis nos anos 1960. “O objetivo é defender a ciência que, hoje, é vítima de um ataque sem precedentes e lembrar que a ciência, em toda a parte, interessa a todos e contribui para a proteção do planeta em que vivemos e da nossa saúde”, explica, em entrevista ao Guardian, Kenneth Kimmell, presidente da organização sem fins lucrativos Union of Concerned Scientists.
A marcha ocorreu em mais de 500 cidades do mundo, da Cidade do Cabo, na África do Sul, a Wangdue, no Butão. É forte o compromisso europeu. Na Itália, a praça principal foi a de Roma.