Martinho Santafé
Os ratos continuam à espreita. Já no terceiro dia da “greve” dos caminhoneiros (coloco entre aspas porque greve de patrão é outra coisa, é locaute), o deputado e líder sindical Paulinho da Força e outros parlamentares à esquerda, à direita e do Centrão sugeriram a demissão do presidente da Petrobras Pedro Parente, a mais recente Geni do cenário político nacional, pois tem sido responsabilizado (junto com a Globo, sempre ela…) por coxinhas, mortadelas e outros espécimens jabuticabas de alta complexidade por uma crise que não inventou.
A crise, na verdade, começou a ser gestada lá no governo JK, quando o então presidente com fama de progressista adotou o slogan “50 anos em Cinco” e iniciou a desconstrução da infraestrutura centenária do modal ferroviário que funcionava bem desde o Império, a fim de transformar o país em uma imensa rodovia – hoje com mais buracos e lama que asfalto. Por uma triste coincidência, um país realmente desenvolvido se reconhece pela qualidade e extensão de suas ferrovias.
Estavam inauguradas no final da década de 1950 a era das carretas e a categoria dos chantagistas sobre quatro rodas. Décadas depois, já tri-campeões mundiais nos gramados, quebraríamos o recorde global de acidentes automobilísticos, com mortos, feridos e deficientes físicos comparáveis a uma guerra civil, ranking ampliado no dia-a-dia pelos milhões de motociclistas que trafegam por nossas ruas e rodovias. E mais recentemente, após os relatórios do IPCC sobre mudanças climáticas, despontamos entre as principais lideranças dos poluidores da atmosfera. Nessas modalidades, nosso país continua imbatível. Viva os combustíveis fósseis! Viva o Século XX!
Nos meus 67 anos bem vividos, preservei poucas certezas, mas uma delas é inarredável: se Paulinho da Força & Cia. são a favor, soy contra! Aliás, nunca vi nem ouvi deste e de outros personagens conhecidos ou nem tanto nada que lembrasse alguma crítica a ex-presidentes e ex-diretores recentes da estatal queridinha dos nacionalistas contra a rapinagem sistêmica cometida por eles, em conluio com a elite da corrupção no Congresso, no Governo e nas empresas. Na verdade, o que leio ultimamente são verdadeiros tratados complexos e sofisticados descrevendo as estratégias geopolíticas e os nebulosos bastidores do mercado internacional do petróleo, “dominado pelos interesses imperialistas que colocam em constante risco as nossas ricas reservas do pré-sal”. Nem uma linha sobre os R$ 40 bilhões de prejuízos sofridos pela Petrobras em conseqüência da política de preços demagógica e irresponsável, como também a respeito dos bilhões desviados da empresa pela corrupção. É uma crítica seletiva com claro verniz “ideológico”, mas com um novo “bode expiatório” da vez.
Enquanto essa turma insiste em preservar as narrativas do século passado tendo o devido “escrúpulo” de, sutilmente, perpetuar o ranço escravagista do século anterior, outros países cujas riquezas não são tão “cobiçadas” como as nossas – mas que optaram por priorizar o conhecimento e a informação ao invés da safadeza -, já lançaram o carro elétrico, devem lançar nos próximos dois anos, o carro autônomo e outras inovações que certamente custarão a chegar até nós. A Alemanha, por exemplo, estipulou um prazo máximo de 10 anos para proibir totalmente a circulação de veículos movidos à diesel. Aqui, continuamos sonhando com o pré-sal, seu potencial quase infinito de poluição, seus milhares de empregos prometidos e nunca cumpridos, seus milhares de cidadãos exilados nas periferias desta riqueza ilusória e, como sempre, poucas dezenas de “meia-dúzia” de espertos no topo da pirâmide. Lembra Macaé? Pois é…!
Concluindo: por que Pedro Parente, representante de uma diretoria nomeada por um governo altamente suspeito e com credibilidade quase zero, mas que adotou o “compliance” para blindar a empresa das ratazanas públicas e privadas, passou a ser a Geni deste conturbado cenário nacional, a ponto de parlamentares em quem eu não confiaria a vigilância de meu galinheiro pedir a sua saída?
Ora, porque no obsceno imaginário político-institucional do país, a Petrobras continuaria sendo a eterna “vaquinha das tetas de ouro”, cuja “generosidade” viabilizada pelos impostos escorchantes cobrados aos consumidores “na bomba” alimenta o apetite voraz da União, dos estados e dos municípios, materializando a compra de votos no Congresso e nas campanhas eleitorais, os jantares em Paris e os shows superfaturados. Sem contar, é claro, com o sonho de consumo de todo político corrupto: “aquela diretoria que fura poço”. E tudo isso financiado pela imensa legião de otários conformados que sacam seus cartões de crédito como se fossem ingressar no Paraíso. Alguns deles até brilhantes no esforço de explicar o inexplicável.
“O petróleo é nosso”? Nós quem, cara-pálida?