Lais Carregosa, Geraldo Campos Jr. e Marisa Wanzeller, da Agência iNFRA
A MP (Medida Provisória) 1.304, aprovada pelo Congresso no último dia 30, deve destravar a renovação das concessões de usinas hidrelétricas com contratos vincendos até 2032 ao simplificar o processo, acabando com o regime de cotas, afirmam advogados e especialistas do setor elétrico ouvidos pela Agência iNFRA.
O texto final da MP permite ao governo renovar por 30 anos ou relicitar concessões anteriores a 2003 e traz uma série de comandos para regulamentação pelo MME (Ministério de Minas e Energia). Segundo fontes, confirmada a sanção do trecho, um decreto com as diretrizes para esse processo deve ser publicado pela pasta, assim como ocorreu com as prorrogações de distribuidoras.
Interlocutores apontam que precisarão ser fixadas, por exemplo, regras para uma avaliação de quando é mais vantajoso renovar ou relicitar. Esse ponto provoca disputa entre grandes geradoras – de um lado, as que querem prorrogar seus contratos, e do outro, companhias que pretendem disputar os ativos no mercado.
Segundo levantamento da Agência iNFRA com base em dados da ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica), 21 processos de renovação de hidrelétricas se encontram na reguladora, enquanto cinco já foram encaminhados ao MME com recomendações da agência tanto pela renovação quanto pela relicitação e estão aguardando decisão da pasta.
No setor, há quem entenda que a nova legislação pode fazer com que os processos que já passaram pela ANEEL e foram enviados para o MME retornem à reguladora para nova instrução conforme as mudanças feitas. A opinião, no entanto, não é consenso, com avaliações também de que o próprio ministério poderá reanalisar os casos que já tenham recomendação da agência conforme a nova lei.
Regime de cotas
Para os agentes, o mais polêmico dos entraves até agora era a renovação sob o regime de cotas – com tarifas fixadas conforme as cotas de garantia física destinadas às distribuidoras. Essa regra, criada pela MP 579/2012 (atual Lei 12.783/2013), tem sido aplicada pela ANEEL inclusive para usinas outorgadas sob os regimes de autoprodução e de produção independente. Mas, com a MP 1.304, o regime deixa de ser obrigatório.
À Agência iNFRA, o advogado Henrique Reis, sócio do escritório Demarest Advogados, explica que com a MP, abre-se a possibilidade de novo prazo de outorga de UHEs com mais de 50 MW fora do regime de cotas para usinas outorgadas antes de 11 de dezembro de 2003, mediante prorrogação ou licitação, a critério do MME. “[A MP] possibilita tanto a prorrogação quanto a licitação fora do regime de cotas, acho que essa é a grande alteração que está sendo feita”, afirma.
Fontes do governo avaliam o trecho como uma mudança importante, uma vez que resolve um imbróglio que remonta à MP 579 e que tornava a renovação pouco atrativa para os investidores.
O diretor de Regulação da Abiape (Associação Brasileira dos Investidores em Autoprodução de Energia Elétrica), Daniel Pina, também destaca o fim do regime como algo positivo. “O texto tira uma das coisas que talvez seria uma das mais danosas para o nosso futuro, que é abrir o mercado de baixa tensão tendo por outro lado a obrigação de que um volume crescente de hidrelétricas fosse prorrogado ou licitado pelo regime de cotas”, afirma.
Casos na ANEEL
Na lista de pedidos de prorrogação, há casos em que a ANEEL recomendou ao MME o indeferimento e relicitação justamente pela recusa das concessionárias de aderirem ao regime de cotas. É o caso, por exemplo, da UHE Sobragi, operada pela CBA (Companhia Brasileira de Alumínio).
Nesta semana, a diretoria colegiada da agência analisará em circuito deliberativo mais dois pedidos de renovação. Um deles, da UHE Santa Clara, com voto disponibilizado pelo relator, diretor Gentil Nogueira, pela renovação e alteração do regime de produção independente para cotas, conforme pleito da própria empresa. O outro, da UHE Mascarenhas, com voto do diretor Willamy Frota pela renovação fora do regime de cotas, conforme previsão de uma lei de 1995 que consta no contrato original da usina.
Insegurança
Para Daniel Pina, da Abiape, apesar de resolver algumas das questões que preocupam o setor, a MP 1.304 gera alguma insegurança para os agentes ao não determinar um prazo para a regulamentação da renovação ou licitação das usinas.
“De toda forma, o que mais nos deixou um pouco ansiosos é essa questão de não ter um prazo para essa decisão do Poder Concedente entre prorrogar ou licitar, e ficarmos naquela mesma discussão sobre casos concretos que estão na ANEEL e que ficam pendentes dessa decisão e de quando [a decisão] será tomada”, disse. O especialista cita ainda a possibilidade dessa decisão envolver mais ministérios além do MME, o que torna o processo ainda mais complexo.
Ele também destaca uma interrupção no ciclo de investimentos nas usinas hidrelétricas, devido à incerteza sobre o modelo a ser adotado pelo governo. Pina conta ainda que o Leilão do GSF (sigla para risco hidrológico), realizado em agosto, foi uma forma encontrada pelas usinas para estender os seus contratos por mais alguns anos, enquanto esperam o MME decidir sobre a postergação ou relicitação das concessões.
Segundo levantamento da Agência iNFRA, há 22 usinas prorrogadas no regime de cotas – a grande maioria PCHs (Pequenas Centrais Hidrelétricas).








