Lula veta projeto que classifica o Norte e Noroeste Fluminense como semiárido

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vetou o projeto de lei 1.440 de 2019, que classifica o clima das regiões Norte e Noroeste Fluminense como semiárido. O texto, de autoria do prefeito de Campos, Wladimir Garotinho (PP), enquanto exercia mandato como deputado federal, foi aprovado no Senado no último dia 15 de julho. Wladimir afirmou que irá lutar pela derrubada do veto.

Os vetos citados em mensagem enviada ao presidente do Senado afirmam que é competência do Conselho Deliberativo da Sudene a delimitação da região. Outro trecho afirmou que é inconstitucional a inclusão da região no Garantia-Safra sem apresentar estimativa de impacto orçamentário-financeiro correspondente e sem previsão de compensação. O veto da criação do Fundo de Desenvolvimento Econômico do Norte e do Noroeste Fluminense já havia sido negociado pela oposição com o governo Lula durante a tramitação no Senado.

O Congresso Nacional analisará, após receber a mensagem do veto, terá o prazo constitucional de 30 dias corridos para deliberação pelos senadores e deputados em sessão conjunta. Para a rejeição do veto é necessária a maioria absoluta dos votos de Deputados e Senadores, ou seja, 257 votos de deputados e 41 votos de senadores, computados separadamente. Registrada uma quantidade inferior de votos pela rejeição em uma das Casas, o veto é mantido.

O prefeito Wladimir declarou que o projeto de lei é a redenção econômica da região e que irá unir esforços para conseguir a derrubada do veto. “É lamentável vivenciar o desprezo do governo federal com a nossa terra. Onde estão os petistas da nossa cidade e região que não se levantam em favor do nosso povo? Preferem incitar invasão de terras a dar liberdade e crédito para que eles possam viver do seu trabalho. Dia triste, lamentável ”, cobrou.

Frederico Paes, vice-prefeito de Campos, lamentou a decisão do presidente. “É uma demonstração de falta de respeito pelo Governo Federal ao interior do Estado do Rio de Janeiro. A alegação de falta de “estudo técnico” é falsa e leviana. É hora de políticos, instituições e sociedade se unirem para derrubar o veto e garantir o futuro da nossa região”, disse.

“A gente lamenta, tendo em vista que é um projeto que beneficia não só Campos, mas também os outros 21 municípios que compõem o Norte e Noroeste Fluminense. E mesmo sabendo que é difícil, esperamos que o Congresso possa rever essa questão para a derrubada do veto”, acrescentou Fred Rangel, presidente da Câmara de Vereadores de Campos.

Leo Pelanca, prefeito de Italva e presidente do Consórcio CIDENNF (Consórcio Público Intermunicipal de Desenvolvimento do Norte e Noroeste Fluminense), entidade que representa os municípios, argumentou que “as mudanças climáticas têm sido severas. Isso compromete a produção agrícola e torna inviável a continuidade de diversas atividades no campo. Isso tem provocado o empobrecimento da nossa população e desestimulado nossos agricultores, que precisam de apoio e segurança para voltar a investir na agropecuária.”

O presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas de Campos, Fábio Paes, advertiu que “o veto do presidente Lula ao projeto do Semiárido, balizado por estudos técnicos, foi uma decepção não esperada. Mais uma vez, perdemos a oportunidade de termos uma legislação favorável ao nosso desenvolvimento, como perdemos muitas outras oportunidades.”

Tito Inojosa, vice-presidente na diretoria da Federação dos Plantadores de Cana (Feplana), relembra que, por conta da seca da região, foram perdidas cerca de 15 mil cabeças de gado na região. “Esse veto é um absurdo. É uma luta de anos”, protestou.

Ricardo Menezes, presidente da Costa Doce Convention & Visitors Bureau (CDC&VB), disse que o veto é um balde de água fria. “O PL do Semiárido foi proposto e é um avanço para o desenvolvimento de 22 municípios e não um agrado. O Costa Doce C&VB estará junto a todas as entidades levando às autoridades de direito os pedidos e solicitações para a reversão desse veto.”, concluiu.

Esperança pela Garantia Safra

André Ceciliano, secretário nacional de Assuntos Parlamentares, o senador Carlos Portinho (PL-RJ) e o deputado federal Lindberg Farias (PT-RJ) estarão em Italva, na próxima sexta-feira (15), para uma reunião do Consórcio Público Intermunicipal de Desenvolvimento do Norte e Noroeste Fluminense (CIDENNF) para debater alternativas que garantam benefícios como o Garantia Safra aos agricultores da região.

Neste encontro, uma das propostas é possibilitar ao produtor rural do Norte e Noroeste Fluminense ter garantias similares às oferecidas pela Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), por meio do projeto de lei 1.282/24. Este PL prevê medidas específicas para o desenvolvimento sustentável de áreas agrícolas. A nova proposta é uma alternativa em relação ao PL do Semiárido.

André Ceciliano afirma que “nosso objetivo é encontrar uma solução para amparar os agricultores do Norte e Noroeste Fluminense, que têm enfrentado uma situação cada vez mais dramática devido às mudanças climáticas, especialmente pela irregularidade das chuvas”, explicou André.

Uma das mudanças previstas no texto reduz de 50% para 40% o mínimo de perda de safra exigido para que agricultores familiares possam acessar o benefício Garantia-Safra. O projeto foi aprovado na Câmara dos Deputados em julho e aguarda votação no Senado Federal.

“A escassez de água na região tende a aumentar”, afirma geógrafa da UFF, Adriana Filgueira

Gilberto Gomes, secretário de Comunicação do PT, justificou a opção dos vetos pelo presidente Lula. “O projeto retorna ao Congresso onde poderá ser debatido com mais clareza e ajustes importantes serão feitos. Sem dúvida os pequenos agricultores sofrem nos períodos de seca em Campos, mas chama atenção que pouco se mencionava na defesa do PL incluir os pequenos agricultores em ações como a política de cisternas, por exemplo, de menor custo porém que teriam alto impacto nas nossas comunidades. Alem disso, avalio que a situação de semiárido em Campos é reversível, logo, deve ser questionada como chegamos até aqui. Esse projeto trata como perene uma situação que é reversível”, explicou.

Adriana Filgueira Leite, doutora em Geografia e professora do Departamento de Geografia da UFF/Campos, explica que a mudança na classificação não é a resolução dos problemas. “Nós, ambientalistas e pesquisadores das universidades, não estamos contra os produtores rurais. Apenas queremos que a água volte pelos meios que são mais indicados. Então, não é convertendo as regiões Norte e Noroeste em semiárido que a gente vai resolver o problema da escassez hídrica.”, indicou.

De acordo com o Vinícius Lima, Ph.D. em Geografia pela UFF (Universidade Federal Fluminense) e pesquisador de pós-doutorado do laboratório de ciências ambientais da UENF (Universidade Estadual do Norte Fluminense), a região Norte e Noroeste Fluminense sofre desde o século XIX, com alterações drasticas na dinâmica da natureza, processo esse que se intensificou ao longo do século XX. Com isso, incontáveis lagoas e brejos foram drenados e a dinâmica das águas superficiais, bem como a disponibilidade hídrica na região, foi completamente alterada.

“A gente tem que modernizar nossas práticas agropecuárias, porque os nossos produtores rurais são conservadores e são, em geral, contra as práticas ambientais modernas. Então, eu acho que essas práticas poderiam muito bem ajudar a reverter o nosso quadro de escassez hídrica”, ponderou Adriana.

“É necessário que seja estabelecido um diálogo aberto entre o Poder Público, as Universidades e a Sociedade Civil que, em acordo com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 da ONU, busquem um caminho onde a dinâmica das sociedades humanas esteja em acordo com a dinâmica da natureza para o correto ordenamento territorial-ambiental”, finalizou Vinícius.