Entre o sutil e o explícito, o Brasil caminha para o precipício climático

"De certa forma, o que estamos vendo é um casamento arrumado entre o negacionismo sutil do governo Lula com o explícito que é promovido pela bancada que representa os interesses do latifúndio agroexportador e das mineradoras."

Por Marcos Pedlowski

Como previ em um artigo publicado em março pelo Nova Democracia, a COP30 se configurou com um imenso fracasso no tocante à adoção das medidas necessárias para impedirmos o precipício climático que está sendo gerado pela contínua dependência de combustíveis fósseis para movimentar o sistema produtivo capitalista.  Se olharmos para as principais decisões adotadas na COP30, é possível notar que ali se consumou a adoção de formas de mercado para tentar debelar os efeitos negativos gerados pelo sistema produtivo capitalista.  Mas o parcos resultados não podem ser vistos como surpresa, na medida em que as corporações multinacionais do petróleo e do complexo alimentar possuíam mais lobistas do que delegações de muitos países somados. 

Por outro lado, as idas e vindas do presidente Lula a Belém serviram apenas para explicitar as limitações das propostas de uma forma particular de negacionismo climático, o sutil.  As principais propostas do governo brasileiro, se é que se pode chamar aquilo de proposta, encontraram forte resistência política e financeira.  O autodenominado Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF), que na prática é uma espécie de consórcio das florestas, acabou reunindo menos promessas de alocação de recursos do que esperado e não se antevê que poderá conter as pressões no sentido de avançar a exploração das áreas que ainda estão cobertas por florestas, especialmente na região tropical.  Além disso, o tal mapa do caminho para alcançar a diminuição do uso dos combustíveis fósseis sequer foi incluído na declaração final da COP30. Aliás, esse resultado foi até facilitado pela guinada feita pelo presidente Lula em prol da exploração de petróleo e gás na Foz do Amazonas.  Ao fazer isso, o Brasil se colocou em uma posição fragilíssima para argumentar em prol da diminuição progressiva do uso de combustíveis fósseis na matriz energética global. 

Coerente e antenada com o fracasso da COP30, a maioria dos deputados e senadores que compõe a atual legislatura entraram em campo para derrubar 52 dos 63 vetos impostos pelo presidente Lula ao chamado PL da Devastação.  Essa derrubada era também esperada, na medida em que a mesma coisa já havia ocorrido durante a tramitação do PL do Veneno. Naquele caso, Lula vetou uma parcela menor dos artigos que foram posteriormente facilmente derrubados por este mesmo congresso. Mas se engana quem acha que houve uma resistência real por parte da bancada governista para manter os vetos de Lula no PL da Devastação.  O que houve, quando muito, foi um simulacro de resistência já que o governo Lula negociou diretamente com Hugo Motta e Davi Alcolumbre a aprovação do PL da Devastação, já que existe um claro interesse governista em passar a boiada na BR-319 e na Foz do Amazonas.

De certa forma, o que estamos vendo é um casamento arrumado entre o negacionismo sutil do governo Lula com o explícito que é promovido pela bancada que representa os interesses do latifúndio agroexportador e das mineradoras.  A diferença entre um e outro é apenas performática, na medida em que o resultado final será um avanço no processo de extração de recursos para alimentar uma economia cada vez mais agromineral dependente. 

O problema é que todo esse cenário se dá em meio ao aumento das evidências de que o Brasil é uma espécie de lócus privilegiado do colapso climático. Se olharmos apenas para as últimas semanas veremos vários episódios de eventos meteorológicos extremos varrendo cidades, sejam na forma de ventos catastróficos, chuvas de granizo com pedras gigantes, ou ainda na seca aguda que compromete o abastecimento hídrico da maior área metropolitana do hemisfério sul.

Aliás, há que se dizer que um dos locais aplastados recentemente por um evento meteorológico extremo, Rio Bonito do Iguaçu foi o município brasileiro que mais desmatou a Mata Atlântica entre 1985 e 2015, com 24,9 mil hectares de florestas destruídas, o que representa aproximadamente 60% da mata original daquela região. Este desmatamento excessivo foi impulsionado pelo latifúndio agroexportador, e expôs o a eventos climáticos extremos, como o recente tornado que devastou grande parte do município. Desta forma, é possível afirmar que o caos instaurado por um tornado em Rio Bonito do Iguaçu é uma espécie de antessala do que deveremos ter pela frente como resultado da combinação das diferentes formas de negacionismo climático.

Diante de um cenário de precipício climático explícito algo óbvio a se dizer é que precisamos reagir de maneira urgente e firme. Os problemas que estão já presentes por causa das formas capitalistas de espoliação da natureza vão ser aprofundados por essa combinação dos negacionismos aqui apontados. É urgente construir a resistência climática sob um novo marco, de forma a incluir a classe trabalhadora e a juventude na construção de ferramentas de transformação de uma realidade que nos encaminha para o colapso climático.

Pôster ‘Terra para quem nela vive e trabalha!’ https://lojadoand.com.br/produtos/poster-terra-para-quem-nela-vive-e-trabalha-npo0j/