Estado do Rio de Janeiro não tem plano estratégico para evitar incêndios florestais

Incêndio na Região Serrana do Rio de Janeiro. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

Dados do Centro Estadual de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden-RJ), atualizados em 4 de agosto de 2025, mostram que praticamente todo o território fluminense está sob risco “muito alto” para a possibilidade de fogo nas matas

Em 2024, o número de incêndios florestais no estado do Rio de Janeiro aumentou em relação aos anos anteriores, com um crescimento de mais de 85% em comparação ao mesmo período de 2023, informou o Corpo de Bombeiros.

No ano passado, foram registrados mais de 16.500 incêndios florestais em todo o Rio de Janeiro. A tendência de crescimento acende um alerta para 2025.

Dados do Centro Estadual de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden-RJ), atualizados em 4 de agosto de 2025, mostram que praticamente todo o território fluminense está sob risco “muito alto” para incêndios florestais, com exceção da Região Serrana, classificada como “alto risco”.

O cenário é agravado por uma escalada alarmante nos indicadores: entre maio e junho deste ano, os focos de calor saltaram de 73 para 168 — um aumento de 130% — e as áreas queimadas cresceram de 278 para 960 hectares, um avanço de 244%. A tendência, segundo especialistas, é de que agosto registre novos picos, impulsionados pela estiagem, altas temperaturas e baixa umidade do ar.

Segundo um relatório apresentado pelo deputado estadual Yuri Moura (Psol), coordenador da Frente Parlamentar de Prevenção às Tragédias e em Defesa da Moradia Digna da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), a ausência de um instrumento estratégico compromete a capacidade de resposta do Poder Público e expõe a população e o meio ambiente a riscos ainda maiores em um período considerado historicamente crítico.

“Estamos diante de um risco real e imediato. Sem um plano de contingência estadual, sem integração entre os entes públicos e com baixo investimento em prevenção, estamos colocando em risco vidas humanas, a biodiversidade e o patrimônio natural do Rio de Janeiro. Estas áreas queimadas serão cicatrizes para as chuvas no verão, o que pode aumentar o número de deslizamentos e inundações”, afirmou o parlamentar.

Legislação não cumprida

Lei Federal nº 12.608/2012 obriga estados e municípios a manterem planos de contingência atualizados para eventos como incêndios e estiagens. No entanto, o levantamento da Frente Parlamentar de Prevenção às Tragédias e em Defesa da Moradia Digna da Alerj constatou que, até julho deste ano, apenas três municípios fluminenses possuíam planos atualizados: Campos dos GoytacazesMesquita Santa Maria Madalena.

No âmbito estadual, o plano de contingência para estiagem e queimadas, segundo a Secretaria de Estado de Defesa Civil, ainda está em elaboração. Um processo administrativo previa a entrega em maio, mas, desde abril, não houve novas movimentações significativas.

Documentos do Governo do Estado do Rio de Janeiro

O relatório levantado pelo deputado aponta, ainda, para problemas estruturais, como a baixa qualidade dos equipamentos de proteção individual (EPIs) fornecidos a guarda-parques e brigadistas, a ausência de integração com a sociedade civil — incluindo agricultores e comunidades em áreas de amortecimento de unidades de conservação — e a dependência excessiva de recursos da União para operações de combate.

Por sua vez, nenhuma das 40 Unidades de Conservação da Natureza geridas pelo Instituto Estadual do Ambiente (Inea) possui brigadas de prevenção a incêndios florestais.

“O Inea não fez a doação de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), ferramentas, uniformes para nossa Brigada Florestal Tembiguá da Aldeia Mata Verde Bonita, Maricá, criada em abril deste ano de 2025 e capacitada pelo programa PrevFogo do IBAMA de Brasília. Maricá é recordista estadual no ranking do Corpo de Bombeiros de incêndios florestais e abriga em seu território a APA Estadual de Maricá, que é uma UCN com alta biodiversidade e está extremamente vulnerável a incêndios“, afirma Sérgio Ricardo, co-fundador do Movimento Baía Viva.

Imagem da Brigada Indígena de Maricá. Foto: Claudio Fagundes

Em resposta à reportagem, o Inea informou que os guarda-parques que trabalham nas Unidades de Conservação do Estado do Rio de Janeiro recebem treinamento para situações emergenciais, como incêndios.

Pouco orçamento aplicado ao combate a incêndios

O Estado do Rio de Janeiro destinou R$264,1 milhões para a subfunção Defesa Civil, mas apenas R$905,9 mil foram alocados à ação orçamentária “Prevenção a Incêndios e Salvamentos”. Municípios como São José do Vale do Rio Preto apresentam proporcionalmente maiores investimentos — R$1,03 milhão em um total de R$2,07 milhões para a Defesa Civil —, no entanto, a maioria das cidades não detalha despesas específicas.

Planilha de dados orçamentários

A reportagem do DIÁRIO DO RIO fez contato com o Governo do Estado para questionar sobre a ausência de um instrumento estratégico de combate a incêndios, a má qualidade dos equipamentos de proteção individual (EPIs) fornecidos a guarda-parques e brigadistas e também sobre o baixo orçamento dedicado a prevenir e combater o fogo nas matas.

Em nota, Governo do Estado respondeu que “o combate aos incêndios florestais segue como uma das prioridades da Secretaria de Estado de Defesa Civil e do Corpo de Bombeiros Militar do Estado do Rio de Janeiro (CBMERJ) e do INEA, que mantêm uma matriz de responsabilidades dentro do plano de contingência para combate a incêndios florestais. O Sistema Estadual de Prevenção a Incêndios Florestais (SESPREVFOGO), instituído pela Lei Estadual nº 10.628, de 11 de dezembro de 2024, representa um marco na governança integrada das ações de prevenção e combate a incêndios florestais no Estado.

Somente em 2025, mais de 9 mil ocorrências deste tipo já foram atendidas em todo o território fluminense, uma redução significativa em relação ao mesmo período de 2024, quando foram registradas mais de 11 mil ocorrências. Os números justificam um planejamento estratégico de prevenção e resposta bem elaborado da Operação Extinctus, lançada anualmente na temporada de estiagem e ativa há pelo menos 8 anos no estado. Só de investimentos na modernização da estrutura operacional somam-se mais de R$1 bilhão. Desde 2024, especificamente para aquisição de materiais usados em incêndios florestais, foram destinados mais de R$70 milhões.

A tecnologia é aliada nesta atuação dos bombeiros, que contam com dois quartéis especializados em socorro florestal, três helicópteros, com capacidade para transportar até 1.200 litros de água, além de drones com câmeras térmicas que auxiliam no monitoramento e mapeamento das áreas afetadas, proporcionando maior precisão na identificação dos focos de calor. A corporação conta ainda com uma variedade de modernos equipamentos e viaturas de grande porte, como motobombas portáteis, abafadores, bombas costais, foices, enxadas, enxadões, pás de campanha, tanques flexíveis com capacidade de 25 mil litros, motosserras, sopradores, mochilas de ataque, kits para atuação em montanha e barracas de campanha. O CBMERJ antecipa que está adquirindo também mais 10 kits de combate a incêndio florestal e um tanque rígido com bomba de 30 metros.

O Governo do Estado acrescenta que o plano de contingência da Defesa Civil (SEDEC-RJ) para incêndios florestais está disponível para consulta em https://defesacivil.rj.gov.br/index.php/para-municipios/plano-de-contingencias-dc

Para complementar, vale reforçar que apenas em 2025, o INEA executou mais de R$ 1,3 milhão em ações diretamente ligadas à aquisição de EPIs e equipamentos de combate a incêndios fornecidos a guarda-parques e brigadistas. Coturnos, capacetes de incêndio florestal, luvas e macacões de combate a incêndio florestal estão na lista das aquisições. Quanto aos planos de contingência, o INEA esclarece que todas as suas Unidades de Conservação têm os seus documentos atualizados, que são usados em todas as operações do dia-a-dia.