As pessoas são muito imaturas quando se trata do encontro com o real, o encontro com o indizível. E são imaturas porque mamãe ficava falando tudo, mamãe ficava fazendo tudo, a mamãe sempre ficava indicando o caminho. E a pessoa não aprendeu a ler os sinais, a errar, a subir as escadas, a cair e tentar levantar, a falar aquela língua que liberta. Por exemplo, eu tenho um caso de um sujeito que sofria de muito pânico, e foi acumulando isso durante a vida e isso, para ele, foi aumentando…. Ele tinha horror se marcasse uma hora para um determinado compromisso e não se cumprisse, se mudasse o projeto, se houvesse qualquer mudança. E não era só isso: tinha pavor do próprio pânico, tinha pavor de avião, tinha pavor de ficar sozinho.
O que acontece com uma pessoa assim? Ela vive num duto muito estreito que garante a integridade dela, porque, se faltar, se mudar o caminho, ela acha que vai se desintegrar. O psicanalista, por exigência da profissão, ele já se desintegrou há muito tempo e já, então, ele fica troçando com as palavras (porque, se ele voltou, é porque ele não perdeu a guerra – ainda!). E a gente aprende assim: a gente perde, ganha, e vai tentando. A gente estuda, aprende e vai se modificando. Vocês vejam Gilles Deleuze, que foi um filósofo importante e que se suicidou em função de uma grave doença de pulmão. Ele morria de medo de avião, mas isso não o impediu de ser um grande filósofo. Às vezes, o próprio sintoma, seja esse medo que a pessoa produz, pode fazer a pessoa produzir coisas; o medo nem sempre é paralisante. Agora, o caso que eu contava era o seguinte: o sujeito era tão apavorado que a esposa morreu e ele, ato continuum, casou-se de novo, literalmente com a primeira que apareceu. Se não fosse isso, ele estaria a ponto de (psicologicamente) se esfacelar. Por que eu falo isso? As pessoas são muito carentes da figura da mamãe e muitas pessoas fazem maus negócios porque têm medo da existência. E é tão fácil ter medo porque é apavorante. Nasceu! Dançou! Tem alguma coisa que nunca vai ser compreendida; chama-se mistério – morte versus vida.
O pior medo é o medo de viver, pois viver é errar; errar no sentido etimológico, de não saber o caminho, mas criá-lo à medida que se caminha, ao se conhecê-lo, desconhecendo-o, por isso mesmo. Viver é desgarrar-se cada vez mais do útero e do discurso materno que vem agregado a essa proteção do eterno. Mas há pessoas que vivem eternamente presas dele, sendo tudo mais puro terror a ser evitado a todo custo. Viver é errar, acertando qualquer caminho.